procurar nas coisas o que as coisas podem ter de belo. é o que gosto de fazer.
e resisto cada vez mais a todas as outras coisas.
o que as coisas têm de belo é quase sempre algo de muito frágil.
ao contrário do que se pensa, não é nada difícil encontrar as coisas belas em todas as coisas.
aquela linha que o arquitecto sonhou e que os pedreiros construíram e a que nunca mais ninguém ligou.
as três notas de piano, que já sabes estarem ali, mas que te emocionam sempre que passas por aquela canção.
o gato indiferente ao teu olhar meigo que se senta ao colo porque a isso tem direito, ora essa.
as composições de mulheres e velas e crianças e céu do sorolla nos mares cantábricos.
justificar o texto no word na esperança de que o grão de poesia em falta se materialize no ecrã.
o ar fresco daqueles dias em que te levantas cedo e dizes para contigo que aquela é a hora de que mais gostas, como se o planeta tivesse só para ti oxigénio novo e luz nova todos os dias.
a simplicidade da pescada fresca cozida, com os legumes, o ovo e o fio de azeite.
as revistas, sempre as revistas, o prazer de folhear, raramente ler, perceber só com o olhar.
a saudade, não aquela dor do que se perdeu, para sempre se perdeu, mas aquela saudade das coisas que sabemos garantidas, pelas quais podemos esperar, porque sabemos que hão-de acabar em abraço.
aquela estrada, nunca a mesma, a leve sensação de andar perdido, condução serena e veloz, veloz e serena, tudo é alentejo, mesmo quando já não o é.
o livro de poesia que abres ao acaso e te fala da mão que procura e acaricia a pele, o sexo, o amor.
a música dos beach boys.
e o travo do macdonalds numa madrugada de verão?
o sorriso de quando chegas, os olhos que procuram os meus.

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